Escassez Hídrica e a Pandemia
Não existe água para todos
O planeta Terra é constituído em sua maioria por água (75%).
No entanto, 97% desta água não pode ser utilizada pelas pessoas, pois ela é salgada. Da porcentagem que sobra de água doce, grande parte está congelada e outra parte substancial está no nosso subsolo.
A água existente nos reservatórios e que entra nas redes de distribuição, corresponde apenas a 6%, pois a produção agrícola exige uma grande quantidade de água para se desenvolver satisfatoriamente, cerca de 75%, além de uma boa parte ser necessária para as indústrias (21%).
Existe ainda uma grande parte desta água que poderia ser utilizada para algum destes fins, mas está contaminada por resíduos industriais, aterros sanitários, entre outras formas de poluição.
A diferença entre países desenvolvidos e os países em desenvolvimento assusta e mostra que a crise dos recursos hídricos no mundo está diretamente vinculada às desigualdades sociais. Há regiões onde a disponibilidade de água atinge níveis críticos, como os países do Continente Africano, onde o consumo médio é de dez a quinze litros de água por dia, por pessoa. Comparando-se à Nova York, vemos um grande contraste de realidades, onde o consumo desenfreado por cidadão é de DOIS MIL litros de água por dia.
De acordo com informações da Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), 1 bilhão e 200 milhões de pessoas (35% da população mundial) não têm acesso à água potável. 1 bilhão e 800 milhões de pessoas (43%da população mundial) não contam com serviços de saneamento básico adequados. Com base nestes dados, é possível constatar que pelo menos 10 MILHÕES de pessoas morrem todos os anos em decorrência de doenças transmitidas pela água.
Ao fazer uma simples projeção do futuro, podemos ver que todos os 3 bilhões (ou mais) de habitantes que venham a ser adicionados à população mundial no próximo meio século já nascerão em países que padecem da escassez de água.
Economia e a Escassez Hídrica
Com a economia mundial cada vez mais integrada, a escassez de água cruza fronteiras. Como por exemplo o comércio internacional de grãos, onde são necessárias 1.000 toneladas de água para produzir 1 tonelada de grãos. Calcula-se a exaustão anual de um aquífero em 160 bilhões de toneladas de água. Dadas essas informações podemos calcular: 160 bilhões de toneladas de déficit hídrico é igual a 160 milhões de toneladas de grãos, ou a METADE da média de colheita anual dos Estados Unidos, o maior exportador de grãos do mundo.
Atualmente as regiões que mais produzem grãos ão justamente aquelas onde os lençóis freáticos estão em constante decréscimo:
- A planície norte da China;
- Punjab da Índia;
- Sul das Great Plains dos Estados Unidos.
MAS POR QUÊ?
Embora a água tenha capacidade de renovação cíclica, o aumento do consumo pode ser maior do que esta reposição natural, gerando escassez.
O desenfreado crescimento populacional, o constante desenvolvimento econômico das cidades e o aumento das atividades produtivas aumentam não somente o consumo de água no mundo, mas acarretam imensas mudanças no meio ambiente.
A maioria das atividades humanas necessita de água para existir e, por consequência, contribui diretamente na contaminação de rios e mananciais. A mais frequente, causada pelos esgotos ou pela poluição das cidades. Onde o saneamento básico não é adequado, o problema pode ser ainda pior, vide a cidade de São Paulo, que vive em plena crise hídrica, possuindo um grande e volumoso rio (Rio Tietê) que corta todo o espaço urbano, porém inutilizado devido a poluição.
A degradação dos recursos naturais em geral está ligada diretamente à crise hídrica, neste caso falamos não somente da poluição da água em si. Muitos rios sofrem com a erosão de suas margens por conta da retirada das matas ciliares, responsável pela contenção de sedimentos, causando assoreamento dos rios. Com o passar do tempo, muitos deixarão de existir ou diminuirão a sua vazão de água.
A destruição de florestas impacta diretamente na cobertura vegetal em todo o mundo, o que também torna a água gradativamente mais escassa, pois a vegetação tem como função preservar as nascentes dos rios e fornecer, na maioria dos casos, umidade para a atmosfera, o que origina chuvas.
Temos que ressaltar também as mudanças climáticas, decorrentes da intensificação do efeito estufa, que caracterizam o aquecimento global. Muito embora o volume de água do planeta seja sempre o mesmo, o ciclo da água vem ocorrendo com uma frequência menor, causando secas intensas e tornando a falta de água um problema permanente.
A escassez hídrica é um problema mesmo para países ou localidades que possuem água em abundância. Isso corre muitas vezes por questões econômicas, sobretudo em países periféricos, onde a falta de recursos afeta o investimento em sistemas de captação, armazenamento e distribuição de água para a população e atividades produtivas.
Brasil e a Escassez Hídrica
O Brasil é considerado a maior potência hídrica do planeta, detendo 12% da água doce do mundo, porém desigualmente distribuiída ao longo do território nacional.
Na Região Norte está localizada a Bacia do Rio Amazonas, que possui a maior concentração de água no país, tanto pelo rio em questão quanto pela presença do Aquífero Alter do Chão, o maior em volume de água.
Todavia, a maior parte da população brasileira concentra-se nas regiões Sudeste e Nordeste, cujos estados possuem os maiores históricos de secas e escassez de água ao longo do tempo.
Este panorama demonstra um considerável problema, pois a exploração de recursos hídricos advindos da Amazônia é totalmente inviável em virtude do altíssimo custo de transporte e com o eminente impacto natural.
A Escassez Hídrica no Brasil e a Pandemia de COVID-19
31 de dezembro de 2019 – a OMS (Organização Mundial da Saúde) é formalmente informada sobre o surto de uma doença pulmonar, causado por um vírus novo e misterioso na cidade de Wuhan na China. Esta é a data que marca a cronologia da doença que em poucas semanas seria declarada como uma pandemia mundial. Desde então mais de 2 milhões e 600mil pessoas vieram a falecer por conta do COVID-19.
Poucos dias depois de a OMS declarar a doença COVID-19 como pandemia mundial (11 de março de 2020), o Brasil passou a tomar as primeiras ações na contenção da disseminação do vírus. O Ministério da Saúde inicia a regulamentação dos critérios de isolamento e quarentena que deverão ser aplicados pelas autoridades sanitárias em pacientes com suspeita ou confirmação de infecção pelo vírus. Neste momento o Brasil já tem pelo menos 234 casos confirmados e mais de 2.064 casos suspeitos.
O avanço do COVID-19 no Brasil é considerado acelerado, em 25 dias, desde a confirmação do primeiro caso, atingiu-se uma marca que superou a de MIL casos; e apenas uma semana depois já passavam de 3928 casos confirmados.
Em meio ao aumento exponencial dos casos e o distanciamento social sendo considerado a medida mais adequada para contenção do vírus, os meios de comunicação repetiam exaustivamente: “para prevenir o coronavírus é preciso lavar as mãos com apenas água e sabão, várias vezes ao dia”.
MAS TODOS OS BRASILEIROS TÊM ACESSO A ÁGUA E SABÃO?
Estou me referindo à distribuição de recursos hídricos no Brasil e às suas desigualdades sociais. Um exemplo é a população de rua das grandes metrópoles: não possuem trabalho fixo nem vínculos sociais que possibilitem o sustento. Sobrevivem nas ruas em condições de extrema pobreza, sem moradia e menos acesso a água encanada.
Um outro importante exemplo, são as comunidades periféricas das grandes cidades, que além de sofrerem com formas precárias de abastecimento de água, existe uma alta concentração de pessoas em casas muito pequenas, em terrenos restritos, com pouca ou nenhuma ventilação. Dadas tamanha desigualdade social constituída e acumulada historicamente, a população destas habitações torna-se potencial foco de disseminação do novo coronavírus, pois não há como fazer isolamento social nestas condições.
A condição de pobreza em que vivem alguns cidadãos tornou-se ainda mais latente com a aplicação do distanciamento social, pois muitos foram dispensados de seus trabalhos ou tiveram seus ganhos reduzidos, dificultando ainda mais o custeio de itens sanitários básicos e até mesmo os alimentos, aumentando ainda mais a possibilidade de contrair esta e outras doenças, que não deixaram de existir por conta do Coronavírus, como por exemplo o vírus da Dengue, Zika vírus e Chikungunya.
Ainda sobre a gestão dos recursos hídricos e as desigualdades sociais, salientamos o processo de urbanização das cidades evidenciou um grave problema. Com a supervalorização imobiliária das regiões centrais, a população com renda menor foi “empurrada” para as zonas periféricas das cidades, onde assistência médica, saneamento básico e o abastecimento de água muitas vezes ainda não chegaram ou se apresentam de forma bastante precária.
Existem regiões que são construídas ilegalmente, sem planejamento, sistema de esgoto ou tratamento de efluentes, os canos descartam o esgoto no solo próximo às habitações. As pessoas armazenam a água que chega em tanques ou muitas vezes a água da chuva é a sua única fonte.
Para combater a doença é preciso estar limpo, lavar as mãos frequentemente e adequadamente, prescreve a Organização Mundial da Saúde (OMS), mas como fazer isso em condições tão precárias.
A crise mundial que vivemos com a pandemia do Coronavírus mostra o quão frágil é o sistema de abastecimento de água brasileiro. Mostra também que a escassez hídrica no Brasil não é causada apenas pelos eventos extremos (períodos de estiagem e fortes chuvas), mas é consequência de uma sociedade desigual e de muitos contrastes, onde parte da sociedade não tem acesso a água em quantidade, nem qualidade adequadas por questões socioeconômicas.
O acesso à água portável e ao saneamento foram declarados direitos humanos pela ONU (Organização das Nações Unidas) em 2010 e 2015 respectivamente. Foi reforçada também a importância dos serviços públicos de abastecimento de água, bem como os serviços de saneamento de águas residuais como instrumento de realização destes direitos. A implementação destes diretos significa para os Estados a obrigação de respeitar, proteger e garantir que isto aconteça.
Sabemos que isto não vai acontecer da noite para o dia, mas como sociedade, temos a obrigação de defender a universalização do acesso à água, acompanhar as ações progressistas, contínuas e sustentáveis em favor deste bem.
Fontes de pesquisa:
- Manual Sobre os Direitos Humanos à Água Potável e Saneamento para Profissionais – Robert Bos
- OSC Politize!
- Revista Carta Capital
- COEP – Rede Nacional de Mobilização Social
- Ministério da Saúde
- ANA-SUS
- Instituto Humanitas UNISINOS
- CETESB
- Blog empresa Ideia Sustentável
- Agência Brasil
- Portal Brasil Escola
- Site Toda Matéria
- Fotos Pexels
Escrito por: Aryadne Egawa - Especialista em Marketing Estratégico na HydroInfo